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quinta-feira, 25 de novembro de 2010

MISTÉRIO DE DEUS – 9


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“Quem sabe se este anseio de eternidade, não será já um sinal de Deus em mim?”

Apelo divino e natureza humana

Esta semelhança é a do amor que nos coloca em pé de igualdade com Deus, na partilha da Sua própria vida, pois o amor cria igualdade e partilha, sempre de acordo com a nossa natureza humana que Jesus partilhou, isto é, segundo os seus limites.

Deus criou o homem e a mulher com desejos imensos, mas medidos pela sua própria capacidade.

Tal é o paradoxo deste animal racional: ínfimo (pequeníssimo) e infinito, como dizia pascal:

“O Homem excede infinitamente o Homem”.
Nós temos uma natureza, uma estrutura específica.

Não somos nem anjos nem animais;

nem puros espíritos, nem simples animais, mas animais racionais:

um pouco de anjo e um pouco de animal; com a luz dos anjos e com a carga e a selvajaria dos animais.

Deus fez-nos capazes de um amor que pode ultrapassar o dos anjos.
Mas nós não estamos limitados ao instinto como os animais.

Temos o livre arbítrio, isto é, a possibilidade de escolher e construir livremente a nossa vida.
A nossa natureza humana é chamada a ser completada através da obra da razão.

A natureza torna-se apenas humana pela cultura.

A educação é um processo longo e deveria implicar uma abertura para a divinização que só Deus pode dar.
Alerta para a desnaturação, destruição da natureza humana
A filosofia materialista pretendeu tirar ao homem a sua natureza humana.

Alguns dizem: o homem não tem natureza.

É apenas uma liberdade. É o criador de si mesmo.
Mas esta filosofia condena o homem a criar tudo e isso é demasiado para o Homem, ultrapassa-o.

A inteligência é comprometida no sofisma (erro de pensamento em que, de má-fé, se usam argumentos falsos com aparência de verdade).

A criatividade é confundida com bizarrias (excentricidades, coisas estranhas).

A sexualidade torna-se deboche.

A vida torna-se uma desordem; o seu impulso vital é levado para a frente, para a novidade, mas sem finalidade, que vai de decepção em decepção.
O homem fechado sobre si próprio exalta-se na destruição e na violência, pois é nesse domínio apenas que se ele se pode vangloriar de ser a causa primeira (do mal).

Só Deus é Causa Primeira, criador do ser.

Mas o homem tem a capacidade de ser a causa primeira do mal: pode desviar, quebrar, amputar o ser.

Ele torna-se o pseudo-criador do não-ser.
Com Deus, o homem pode ser criador;

sem Deus pode destruir o ser por sua própria iniciativa e torna-se a causa primeira da criação do não-ser.
É o triste privilégio da liberdade criada.
Deus colocou no coração do homem uma sede infinita: a sede de Deus.

E essa sede subsiste, se ele desconhece Deus e procura saciá-lo noutro lugar.

Essa fé desviada levou os homens levou os homens de hoje a querer inventar um homem novo, completamente diferente e desfiguraram a figura humana.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

MISTÉRIO DE DEUS – 8

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“Há em mim uma sede inquietante de Infinito”
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A experiência de Deus
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A nossa experiência de Deus é dupla:
a) Presença transcendente e imanente de Deus Criador.
b) Presença misericordiosa, cujo amor total nos estabelece num pé de igualdade com Deus: “Já não vos chamo servos, mas amigos” (Jo 15,15), pois o amor cria igualdade: e o amor de Deus, sem limites, foi para isso até à morte e à Eucaristia.
Esta experiência de Deus é mais discreta que a experiência de Deus Criador, pois o amor de Deus esconde-se durante a peregrinação de fé em que Ele nos acompanha.
Ele está junto de nós como uma fonte escondida.
Se Ele se revelasse nós já não seríamos desta terra: “ninguém pode ver a Deus sem morrer”, diz a Bíblia
A experiência de Deus Criador, podemos de alguma maneira aceder a ela, através dos nossos recursos humanos, olhando para as coisas criadas; mas o Amor Salvador é o fruto de um dom gratuito.
Nós temos de realizar em nós a verdade do Amor Salvador.
- Isto supõe a ordem da nossa vida, a sua rectidão, pois os nossos pecados, obscurecem a experiência do Amor misericordioso que nos salva, donde a insistência de Cristo sobre a importância de realizar os seus mandamentos.
- Esta verdade realiza-se pela caridade, pelo serviço dos outros.
- Realiza-se nos actos de culto, onde Cristo constrói e alimenta o Seu Corpo que é a Igreja e o faz frutificar.
- Esta experiência de Deus realiza-se na experiência da fé e quem faz essa experiência aproxima-se da luz.
Deus é tudo.
Ele é suficiente e o único necessário.
Mas Ele criou-nos homens e toma-nos a sério… até à loucura.
O nascimento humano e a morte do Filho de Deus são a prova disso. Para o Homem, a resposta adequada às questões essenciais é Deus, mas, depois disso, é o Homem. Com efeito, nós somos apenas Homens.
É como Homem no belo quadro da natureza humana que Deus nos convida gratuitamente a sermos seus comensais.
O humanismo perdeu Deus e perdeu-se a si próprio pelo pecado.
É reencontrando Deus que o Homem se reencontrará, pois a sua identidade brota do próprio Deus, como Criador e como Salvador.
Ela brota do Amor Criador.
O Homem que nós somos apenas atinge Deus humanamente, nessa humanidade que é o nosso lugar, a nossa vida, a nossa medida.
Temos, portanto, de entrar em contacto com Deus como Homens, lenta e progressivamente e à medida de Deus, pois Deus diviniza-nos.
Diviniza-nos, mas segundo a nossa natureza humana.
Nós não somos chamados a ser um Super-Homem: um homem inchado, enfunado, com voltagem reforçada.
Somos divinizados na nossa pequenez e na nossa própria humildade, de acordo com a capacidade de amor que o Criador colocou em nós.
Nós somos divinizáveis, porque criados à imagem de Deus.
As nossas capacidades de conhecimento, de liberdade, a de amor, tornam-se capazes de aceder à imagem e semelhança de Deus pela graça divina.
Pe. Albano Nogueira

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

MISTÉRIO DE DEUS – 7

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“Tenho uma sede imensa, mas não de água”
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A experiência do Deus Salvador
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O Homem, rei da terra, falhou no seu destino pelo pecado.
Por isso, Deus Criador fez-se Deus Salvador.
Tudo isto sabemos não pela nossa razão, mas através da Revelação.
Nós perdemos muito esse sentido de Deus Salvador porque se perdeu o sentido de pecado e o sentido do novo nascimento para a vida de Deus.
Existe nos humanos a concupiscência, isto é, a atracção pelos desejos materiais ou sensuais, desejo sexual intenso, a desordem dos desejos, desorientados pelo pecado.
O homem traz em si os gérmenes (sementes) da sua própria perda.
Ele tem necessidade de um Salvador para emergirmos do afundamento do pecado, de sermos salvos da morte, de encontrar “a vida depois da vida”.
Para nos fazer partilhar da sua vida divina, depois de nos ter libertado do pecado, o próprio Criador fez-se criatura na pessoa de Jesus Cristo.
Ele deixou-se imergir, submergir, neste mundo de pecado, que Lhe deu a morte.
Ele fez brotar aqui em baixo a divina fonte de amor, capaz de resolver o drama humano de finitude, do pecado, da morte, da sede insaciável, portanto, infinita, inscrita no coração do homem.
A aventura de Cristo é um mistério de partilha e tem duas etapas: Encarnação e Redenção.
Deus assume a nossa vida humana e dá-nos a Sua vida divina.
Ele tomou sobre si a morte, preço do pecado, a dá-nos a Sua vida eterna. Este mistério da partilha de Cristo tem duas etapas: a Encarnação e a Redenção.
Ele tomou a nossa fraqueza, os nossos males, para nos dar o melhor de Si próprio.
a) Primeiramente, a “admirável permuta” da Encarnação.
O Filho de Deus quis nascer da Virgem Maria, para assumir a nossa humanidade e nos comunicar em troca a Sua divindade.
Tomou a nossa fraqueza, para nos dar a Sua força.
Partilha a nossa temporalidade para fazer aceder à Sua eternidade.
A pessoa divina encarnada tornou-se a célula regeneradora e cabeça da humanidade.
b) Mas era preciso uma outra permuta, um outro trabalho: a Redenção (salvação, libertação). Cristo fez-se pecado por nós, diz S. Paulo em 2 Cor 5, 21, para nos comunicar a Sua justiça, a Sua santidade divina: “sede santos como Eu sou santo” (Lv 19,2).
Cristo morreu de morte humana, para nos dar em troca a Sua vida divina.
Ele comprometeu a Sua Mãe nesta nova permuta.
Pela morte, Ela perdia esse Filho Santíssimo e recebia, em seu lugar, filhos pecadores.
Assim, a Mãe de Deus torna-se Mãe dos homens.
Nós acedemos, por pura bondade, a esse mistério: a nossa divinização.
É para alimentar essa vida, que o Salvador nos dá o Seu Corpo em alimento, numa nova e misteriosa permuta em que o nosso corpo assimila o sinal material do pão, enquanto o nosso ser é transformado, divinizado em Jesus Cristo, sem perda da sua personalidade.
Jesus Cristo inseriu-se no tronco genealógico dos homens e, depois disso, fez de nós, por meio da Sua morte de amor e da Sua Ressurreição, um só corpo místico: divino e humano.

Pe. Albano Nogueira

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

MISTÉRIO DE DEUS – 6

albanosousanogueira@sapo.pt

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“E quanto à fome que me fere como uma lança,
a mais funda é a fome de esperança…”.

DEUS CRIADOR
Eis a primeira verdade a que é preciso chegar:

Deus É Criador.
Quando dizemos Criador, não se entende como algo do passado, num determinado momento e que Deus tenha abandonado o mundo á sua existência e se tenha desinteressado por ele.
Neste caso seria como o Relojoeiro que faz o relógio, vende e não mais se interessa por ele.
A Criação é um processo e não apenas um momento.
A Criação continua, por que o Ser necessário faz existir a cada instante, tudo o que não tem em si a razão de ser.

(Tal como criar um filho não é um instante, mas um processo de muitos anos…).
Eu existo, neste momento, porque Deus me cria, me dá a existência, me sustenta a mim e a tudo aquilo que me rodeia.
“Eu sou Aquele que sou, Tu és aquele que não és…”
Mas nós não somos fantoches nas mãos de Deus.

Deus deu à sua criação uma existência coerente, permanente, autónoma, livre.
Nós não somos escravos.
Deus não tinha necessidade de escravos.
Ele não tinha necessidade de criar.
O Seu desígnio é a generosidade, é a comunicação da Sua bondade, do Seu próprio Amor, a parceiros criados à Sua imagem.
Deus criou criaturas inteligentes e livres, senhores da sua existência, com poder para gerar outros humanos, outras criaturas.
Deus não se fecha em si mesmo.

Ele é comunicação, efusão.
Mas porque é que Deus cria seres livres, rivais, algo perigoso para o homem e para Deus?

Perigoso para o homem que pode perder-se por meio dessa liberdade e perigoso para Deus pois o homem que Ele criou pode ignorá-l’O, negligenciá-l’O, degradar a Sua criação e até erguer-se contra Ele, blasfemá-l’O, desafiá-l’O, odiá-l’O.
O homem com a sua liberdade pode tornar-se deus de si próprio e o ídolo dos outros.

Como tolera Deus esse mal com o qual caminhamos lado a lado?
Eis-nos no centro do mistério.

Deus criou o homem livre, porque Ele cria por amor e para o amor.
Só o homem livre é capaz de amar.
Se Deus criasse robots não seriam capazes de amar.
Sem liberdade seriam capazes de prazer, mas não capazes de amar, pois não há amor sem uma certa autonomia e um dom de si mesmo.
Deus correu o risco de criar a liberdade.

É o risco do amor.
É o risco de Deus, é o nosso risco.
Devemos tomar consciência do nosso risco.

Deus concedeu-nos a escolha e deveríamos fazer uma boa escolha: escolher Deus = Amor.
Se nos crispamos egoisticamente sobre a nossa existência, para vivermos sem Deus, destruir-nos-emos a nós próprios: cortamos a raiz gratificante da nossa existência.

Se aceitarmos Deus Criador, então a nossa existência encontrará o seu sentido e irá de plenitude em plenitude.
Em Deus Criador que dá a Vida sabemos que somos criaturas, que temos um autor, uma origem e uma finalidade, uma meta: a comunhão de vida e de amor com esse Deus e com todos os redimidos.

Pe. Albano Nogueira